Sem noção de amor fraterno// O homem agride o irmão,// Num ato que mostra o inferno// Que traz no seu coração.
Rosa Regis Brincando com os Versos
Pensares que se transformam //espalhando poesia, //pegam carona no vento// enchem meu ser de alegria
Textos
PENSANDO COM MIGUEL DE MOLINOS - texto poético-filosófico
 
Pensando com Miguel de Molinos
 
 

UM CORAÇÃO PACÍFICO É TRONO DIVINO
 
     No Capítulo I do Livro Primeiro da Guia, Molinos nos diz que  devemos ter sempre pacífico o coração para que se conserve sempre puro, estando, assim, sempre pronto para receber a Deus, como um templo vivo. E que devemos aceitar, quietamente, sem qualquer alteração, tudo o que o Senhor nos enviar como prova, sem deixar que nada turbe essa cidade de quietude e paz.


copiando o pensamento de Miguel de Molinos

Com a alma fatigada de tanta meditação
Procures aquietá-la!
Sossega o teu coração!
E repousa amorosamente,
Dando-te a Deus, simplesmente, em pura contemplação.
 
Recolhe o teu pensamento.
Não necessitas pensar!
Aquieta o entendimento que só te faz fatigar!

Contenta-te em só conhecer o que a fé te faz ver

E a Deus mais e mais amar.
 

Esquece o que foi criado:
O sensível, o inteligível, o que é e o que não é.
Pois tudo o que foi deixado,
Por Deus, de uma forma incrível e,  para nós, impossível,
Nos será dado na Fé.
 
É muito pouco o que nós conseguimos entender
Sobre Deus durante a vida.
Mas a vontade é poder!
Quando buscamos o profundo em nós mesmos – lá no fundo,
Ele está no nosso ser.
 

 
E digo ainda (copiando o seu pensamento):
 
Em qualquer inquietude
Deixa que teu coração
Fique sempre sossegado
E livre de tentações,
Penetra dentro de ti
E livra-te das paixões
Causadas por inimigos,
Por suas perseguições,
Porque o homem quieto
Afasta as tribulações.
 
A força, o castelo forte,
Pra livrar-te do inimigo
Seja visível ou não,
Está dentro de tu’alma,
Dentro do teu coração,
Que é onde a divina ajuda
Reside. E nunca diz não.
Basta tão só que te entregues,
Sereno, ao seu socorro,
Às suas sagradas mãos.
 
    Devemos ter sempre em paz o nosso coração para que Deus, o divino Rei, possa nele repousar. [...]“Para que Deus repouse em tua alma, terás que estar com ela sempre limpa, quieta vazia e pacífica”.
 

Continuo:
Com um olhar amoroso e humilde
a alma jaz
Diante do seu Senhor,
que muito feliz a faz,
Sem elaborar palavras
e nem pensar nada mais
Que a tornaria sensível aos enganos possíveis
Que ela,
ao aquietar-se,
Deixou-os todos pra trás.
 
    O que mais importa para a alma redimida, diz ainda Molinos, é a paciência : “Dos divinos bens, não são capazes os sentidos; assim, se tu queres ser feliz e sábio, cala e crê, sofre e tem paciência[...]
 

Poetando:
Sofre, cala, e te entrega
Às mãos do Divino Ser,
De Deus, Bondade Infinita,
Que tudo que irá fazer
Será tão só p’ro teu bem,
E não procures saber
Como Ele irá agir
Pois não irás entender.
Basta tão só que confies.
Assim sendo, “Cala-te e crê”.
 
         ... 
E ao meu coração vazio,
puro, limpo, e sem bolor,
Deus o preencheu com o brilho
do mais puro e belo amor.
 
 

“QUANDO A ALMA CRÊ NÃO HÁ NECESSIDADE DE DIZER”
 
Deus sabe o que há em mi’alma
Sem que eu precise dizer,
E o seu amor me acalma
Preenchendo todo o meu ser.
 
Toma conta dos meus desejos
E da minha imaginação,
Tirando-me qualquer ensejo
De dor, tristeza ou paixão.
 
Mas para que eu O tenha,
Vazia a alma tem que estar
De qualquer um sentimento
Que impura a possa tornar.
 
“A perfeição da alma não consiste em falar nem em pensar muito em Deus, senão em amá-lo muito. Alcança-se este amor por meio da resignação perfeita e do silêncio interior”.

 
A DEUS, O QUE TE CONVIER, A TI, ACEITAR QUIETA E RESIGNADAMENTE

 
"Esteja quieta, alma bendita. Esteja quieta, humilde, e resignada para tudo o que Deus quiser fazer de ti." 
 
    A alma terá ainda, que, nada desejar. Não desejando, portanto, nem mesmo a divina presença em si, pois tal desejo tomaria o espaço que a mesma poderia ocupar.
...
    Pensando Deus como um ser a quem nada pode atingir, como poderia o ser humano, na  sua pequenez, pensar atingi-lo com os parcos conhecimentos que o mundo pode oferecer? [...] O ser humano terá que esvaziar-se de tudo que o faz ficar ansioso: da raiva, do desejo, da compaixão, da tristeza, da alegria, da dor, da vergonha e de quaisquer sensações, até mesmo do amor que dedica ao Senhor Deus, pois para que este possa apossar-se da sua alma, esta terá que estar limpa de quaisquer sentimentos.
    É a pobreza de espírito que leva o homem a dispensar tudo que não lhe for necessário que o aproxima do seu próprio ser[...] E “um homem pobre é aquele que nada quer, que nada sabe e que nada tem.” (Mestre Eckhart)22

    E segundo Molinos, para que a alma  se torne trono  do Divino Ser, terá que está completamente vazia de tudo, seja físico ou espiritual. E aí, restará apenas o trono divino ou o próprio Deus que agirá sobre si mesmo.[...] 
 
"...uma vez que se esgote a análise das premissas que considero necessárias, te mostrarei o caminho que pode levar-te para casa. Fixarei também asas ao teu espírito para que com elas possas elevar-te até as alturas, e quando houver se dissipado todas as inquietações, podes voltar são e salvo à tua pátria sob meu comando, seguindo meu caminho e inclusive em meu próprio veículo." (Boécio).23
 
    E esta, de acordo com Mestre Eckhart, seria uma verdade que deveríamos saber:
 
“Quando o espírito livre se mantém verdadeiramente desprendido, ele força Deus a vir ao seu ser. E se pudesse subsistir sem forma alguma e sem quaisquer acidentes, ele assumiria o ser próprio de Deus.”
 
 Algumas citações que são alguns fragmentos de Heráclito, a partir de Mestre Eckhart, tendo como Título: Viver sem Porquêque nos foi transmitido pelo Professor Doutor Oscar Federico Bauchwitz, do Departamento de Filosofia da UFRN:

“Deixe estar todas as coisas sem importuná-las.”
 
“Que tudo ocorra, se faça, como tem que ser sem que tomemos qualquer decisão para tentar modificar o que é.”
 
“O verdadeiro pobre de espírito esvazia-se totalmente até de si mesmo ou até do desejo de Ter Deus em si.”
 
“Um homem verdadeiramente desprendido por Deus – não busca, pois, mas só deixa-se estar sem qualquer desejo – até mesmo de Deus.”
 
“No supra-essencial ou supra-Deus, homem, mosca e Deus têm a mesma essência”.
 
    Finalmente, vemos em Miguel de Molinos que: “Para que a alma chegue à total transformação com Deus é necessário que se perca e negue o seu viver, sentir, saber, poder e morrer; vivendo e não vivendo; morrendo e não morrendo; padecendo e não padecendo; resignando-se e não resignando-se, sem fazer nenhuma reflexão.” 


ainda poetisando o pensamento de Molinos,
eu digo:
 
Depondo a minha vontade às mãos de Deus, tenho que
deixar que a sua vontade aja, ao seu bel prazer.
Não importa se estou doente, fraco, sem disposição,
é que o meu espírito crente, aceita com gratidão.

Pois sabe ele que o melhor para mim, é o padecer
quieta a minha dor, para a Deus merecer.
E assim, aceitando tudo que vier das mãos do Pai,
vazia do Ser, e muda, minha alma ao céu atrai.

Esquece o que é terreno e o que é divino também;
o que é grande e o que é pequeno; o que faz mal ou faz bem.
Esquece o sofrimento e o que traz alegria.
não tendo mais sentimentos, já que a alma está vazia.

E é esse vazio que gera, em si, a oportunidade
que a alma já não espera, de total felicidade.
Pois o espaço sacrossanto em que a alma se transformou,
onde já não há dor ou pranto; não há ódio nem amor;
...
não há alegria ou quebranto;
desejo, raiva, o que for!
...
É, pois, o espaço adequado que o Ser, modificado,
sem querer, deixou preparado:
Limpo, puro e aquietado, para trono do Senhor.
 
...........................................


 
(Recortes do Trabalho Monográfico de Conclusão do Curso de Filosofia Licenciatura Plena, da UFRN, "O QUIETISMO EM MIGUEL DE MOLINOS", orientado pelo Professor de Filosofia Medieval: Prof. Dr. Oscar Federico Bauschwitz)
 
Por: Rosa Ramos Regis da Silva
Natal/RN - 2003
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AREOPAGITA, D. Teologia Mistica, Biblioteca de Autores Cristianos – BAC. Madrid, 1995.
BAUCHWITZ, O. F. El Conocimiento de la Ignorancia Según Eriúgena, in “Azenoes y los Averroísmos”,  Zaragoza, 1999.
BOECIO, A Consolação da Filosofia, Ed. Martins Fontes, SP, 1998.
CELSO, El Discurso Verdadero contra los Cristianos, Alianza Editorial. Introdución y notas de Serafin Bodelón, Madrid, 1996.
ECKHART, M. O Livro da Divina Consolação in Coleção PENSAMENTO HUMANO, O Livro da Divina Consolação e outros textos seletos, Coord. Emmanuel Carneiro Leão, 2a Edição, Editora Vozes, Petrópolis, 1991.
MOLINOS, M. de, Guia Espiritual, in Guia Espiritual precedida de um ensayo de Claudio Lendinez. Biblioteca Jucá, Madrid, 1a  Edição - 1974 .
MUGUERZA, J., Instituto de Filosofia de Mdrid, El Silencio, cap. 5 – Las Voces Eticas del Silencio. Compilacion de Carlos Castilla del Pinto, Alianza Editorial – Madrid, 1992.
VALENTE, J. A. Ensayo sobre Miguel de Molinos, in JOSÉ ANGELVALENTE, Variaciónes Sobre el Pajaro y la Red precedido de La Piedra Y el Cientro. Tusquets Editores S.A., Barcelona, 1a  Edição –1991.
 
 
Rosa Regis
Enviado por Rosa Regis em 01/07/2012
Alterado em 02/04/2016
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